Quando Rock of Gibraltar completou sua incrível seqüência de sete vitórias de Grupo I, entre 7 de outubro de 2001 e 8 de setembro de 2002 (Grand Criterium, Longchamp; Dewhurst Stakes, Newmarket; 2000 Guineas, Newmarket; Irish 2000 Guineas, Curragh; Saint James Palace Stakes, Ascot; Sussex Stakes, Goodwood; e Prix du Moulin de Longchamp, Longchamp) – e assim, quebrou o recorde anterior, de seis, pertencente ao lendário Mill Reef (Derby Stakes, Eclipse Stakes, King George; Arc du Triomphe, Prix Ganay, e Coronation Cup) – a mídia mundial rendeu-se ao fato de estar diante de um novo gigante das pistas. E passou a chamá-lo de “The Rock.”
No “Timeform – Racehorses of 2002” (pág. 823), a Bíblia inglesa das corridas de cavalo, há uma interessante comparação entre os dois animais, resumida da seguinte forma:
“Rock of Gibraltar, cotação de 133 libras-peso (cerca de 66,5 quilos) no “Free Handicap” de 2002, não pode ser elevado ao mesmo nível de Mill Reef (cotação de 141 libras-peso, cerca de atordoantes 70,5 quilos...), pelo simples fato deste último ter vencido suas principais provas por uma margem, medida em corpos, notadamente mais ampla (seis corpos no King George; três no Arc du Triomphe, onde, inclusive, bateu o recorde da distância; dez corpos no Prix Ganay; quatro no Eclipse Stakes, sobre o tordilho Caro; oito no Coventry Stakes; e novamente dez no Gimcrack Stakes) – o único cavalo de corrida a vencer assim, desde que o sistema oficial de graduação de provas de Grupo foi introduzido em 1971.”
O fato, porém, do “Timeform” ter chegado a discorrer sobre a citada comparação, só fala a favor dos méritos de Rock of Gibraltar como corredor. Então, parece razoável aprofundar alguns comentários e observações sobre o animal, que, segundo se informa, virá fazer a monta no Brasil na estação 2010, em regime de “shuttle.” Como se segue.
Quem é Rock of Gibraltar
Nascido em 1999 na Irlanda, medindo 1,62 m, o castanho Rock of Gibraltar é filho de Danehill (este, por Danzig e Raziana, por His Majesty) e Offshore Boom (esta, por Be My Guest e Push a Bottom, por Bold Lad e River Lady, por Prince John).
Nas pistas, foi apresentado 13 vezes, para vencer 10 corridas, e tirar 2 segundos, entre os anos de 2001 e 2002, na Inglaterra, Irlanda, França, e EUA.
Seu pedigree apresenta algumas particularidades, quais sejam: (i) ele é “inbred” 3 x 3 sobre Northern Dancer (via Danzig e Be My Guest), e 4 x 4 x 4 sobre Natalma (a notável filha de Native Dancer, mãe de Northern Dancer); (ii) sua terceira mãe, River Lady, produziu sete ganhadores, entre eles a Riverman, líder das estatísticas de reprodutores na França.
Rock of Gibraltar correu aos 2 e 3 anos de idade, abordando distâncias entre os 1.000 e os 1.600 metros. A seqüência de suas apresentações é a seguinte:
(1) Estreou em 21 de abril de 2001 no Curragh, Irlanda, 1.000 metros, grama, e ganhou seu “maiden”, em cânter; em 19 de junho, foi a Ascot e entrou descolocado no Coventry Stakes (Grupo III), 1.200 metros; retornou ao Curragh, em 1° de julho, e levantou o Railway Stakes (Grupo III), 1.200 metros; em 22 de agosto, venceu, em York, o Gimcrack Stakes (Grupo II), 1.200 metros; em 14 de setembro, correu e ganhou o Champagne Stakes (Grupo II), 1.400 metros, em Doncaster.
No dia 7 de outubro de seus 2 anos, atravessou o Canal, foi a Longchamp, e registrou a primeira vitória de Grupo I de seu cartel, nos 1.400 metros do Grand Criterium. Treze dias depois, voltou a Newmarket, e anotou a segunda: o Dewhurst Stakes, também em 1.400 metros.
Em suma, aos 2 anos, apresentou-se sete vezes, de abril a outubro, entre 1.000 e 1.400 metros, em três países, uma campanha considerada relativamente árdua para um juvenil europeu.
Ao final de 2001, tinha levantado £ 372,581 em prêmios, e foi classificado como o segundo melhor potro de 2 anos da Inglaterra no Handicap Livre daquele ano (o primeiro foi Johannesburg, invicto em sete saídas às pistas, e considerado, à época, a “o fenômeno juvenil” da cocheira de Aidan O’Brien).
(2) Após um merecido descanso de seis meses, Rock of Gibraltar voltou a competir no dia 4 de maio de seus 3 anos, vencendo o tradicional 2000 Guineas (Grupo I), 1.600 metros, Newmarket, primeira prova da tríplice-coroa inglesa de produtos, e terceiro Grupo I da seqüência antes mencionada.
O quarto Grupo I, veio no dia 25 de maio de 2002, quando brincou com os adversários no Irish 2000 Guineas, 1.600 metros, no Curragh. O quinto, em 18 de junho, no Saint James Palace Stakes, 1.600 metros, Ascot. O sexto, a 31 de julho, no Sussex Stakes, 1.600 metros, Goodwood. O sétimo, novamente na França, no Prix du Moulin de Longchamp, dia 8 de setembro, também na milha.
Sua campanha foi encerrada no dia 26 de outubro de 2002, em Arlington Park, EUA, do outro lado do Atlântico, quando, franco favorito, deixouse bater por meio corpo por Domedriver (um bom filho de Indian Ridge, radicado na França, hoje reprodutor) quando da disputa da Breeders’ Cup Mile.
Sobre esta última corrida, a melhor opinião é do conhecido comentarista americano, Andy Beyer, que depois da prova, afirmou: “Se tivesse sido montado por qualquer jóquei americano – de nível médio que fosse – teria ganho.” E se referindo à crônica européia, completou: “Quando é que vão aprender, que as pistas americanas não possuem aquelas longas retas a que vocês estão acostumados?...”
Tudo isso, vem a propósito da forma de correr de Rock of Gibraltar, e da exagerada confiança nas virtudes do potro, demonstrada por Mike Kinane, seu jóquei, quando da disputa da Breeders’ Cup Mile de 2002. Tendo largado mal, Kinane manteve Rock of Gibraltar no fundo do pelotão (penúltimo, num lote de 14 cavalos) durante toda a reta oposta. E lá permaneceu até a entrada da reta final, mais curta que o normal, quando ainda teve de desviar-se do acidente fatal que vitimou Landseer, seu companheiro de cocheira. Embora tenha descontado toda a enorme vantagem dada aos outros competidores, o disco já havia chegado quando ele ainda estava a meio corpo de Domedriver (diga-se, a bem da verdade, impecavelmente corrido por Thierry Jarnet na ocasião).
Mas foi assim, que Rock of Gibraltar sempre atuou: um fantástico milheiro que costumava vir de trás, e usava sua devastadora troca de marcha para decidir seus confrontos a partir dos 400 metros finais. Foi isso que seu jóquei tentou fazer no percurso estreito de Arlington. Portanto, nada a reclamar.
Dele, na ocasião, há duas opiniões, que convém mencionar: primeiro a de Wayne Lukas, o treinador americano recordista de vitórias na Breeders’ Cup: “Rock of Gibraltar é um monstro.” A segunda, do próprio “Timeform” (pág. 829, “Racehorses of 2002”): “Trata-se de um cavalo sério, de trato muito fácil, com suficiente velocidade para ser corrido em qualquer posição do lote em que o jóquei o resolver colocar.”
Eprossegue (pág. 830): “De modelo compacto, tamanho médio (1,62 m), com uma sólida constituição física, ainda que não seja do tipo que atraia, imediatamente, o olhar do observador. Contudo, é obstinado, genuíno e consistente.”
Rock of Gibraltar foi eleito pela crônica o “Champion 3-years-old da Europa em 2002” e levantou, no total, £ 1,269,970 em prêmios.
Rock of Gibraltar na reprodução
Levado para a reprodução em 2003, e estacionado no Coolmore Stud, Irlanda (inicialmente a 90.000 euros a cobertura...), seus primeiros produtos estrearam em 2006. Entre 2003 e 2009, serviu em regime de “shuttle” na Austrália, e durante o ano de 2007, no Japão.
De 2003, até dezembro de 2009, o cavalo de Susan Magnier e Sir Alex Ferguson (“general manager” do Manchester United), que comprou uma parte do animal após a derrota no Coventry Stakes, já produziu 201 ganhadores de 409 corridas e £9,726,905 em prêmios, na Inglaterra e no exterior. Na Inglaterra, a distância média das provas vencidas por seus filhos é de 1.740 metros.
Entre eles, destacam-se os cinco ganhadores de provas de Grupo I (até dezembro de 2009), a saber:
. o alazão dourado Varenar (em mãe por Mr Prospector), da criação Aga Khan, nascido em 2006, brilhante vencedor do Prix de La Forêt (Grupo I), Longchamp, em 2009, batendo a campeã Goldikova (como seu pai, Varenar correu os 1.400 metros do La Forêt vindo de trás, e acelerando nos 300 metros finais);
. a inglesa Diamondrella (em mãe por Dixieland Band), ganhadora do First Lady Stakes (Grupo I), em Keeneland, e do Just a Game Handicap (Grupo I), em Belmont;
. Mount Nelson (em mãe por Selkirk), Eclipse Stakes (Grupo I), e Criterium International (Grupo I), Saint-Cloud;
. Eagle Mountain (em mãe por Darshaan), ganhador da Hong Kong Cup (Grupo I), segundo no Derby Stakes, Epsom (Grupo I), e na Breders’ Cup Turf (Grupo I); e
. o australiano Rock Kingdom (em mãe por St.Covet), vencedor do Epsom Handicap (Grupo I), em Randwick.
Além de vários outros ganhadores de Grupo na Inglaterra, França, Austrália, e Japão.
Misturas que funcionam
Não é preciso ser um “expert” em pedigrees e origens para perceber que Rock of Gibraltar foi todo construído sobre Northern Dancer (aliás, uma velha paixão da Coolmore).
Mais ainda, seu perfil funcional, ou seja, a forma como ele se expressa em corrida, atende integralmente a esse pressuposto. De brilhante “sprinter” aos 2 anos, transformou-se, aos 3, num milheiro de padrão acima de qualquer avaliação. Dos melhores do turfe mundial nas últimas décadas. E com a característica de usar sua velocidade natural para permitir ser colocado onde seu jóquei o desejasse durante o percurso.
Aqui, um pequeno comentário: correr as grandes milhas de Grupo I da Europa, significa correr duas vezes 800 metros num ritmo de “trem do inferno”, como o classificam os franceses. Duas condições são necessárias para que isso ocorra: a capacidade de galopar a primeira metade do percurso sem entrar em apnéia, e ainda ser capaz de produzir trocas de marcha decisivas a partir do último quarto da disputa. Ou é assim, ou não há chance de vitória.
Sem deixar de mencionar que as pistas nem sempre são planas como as nossas (em Longchamp, por exemplo, os 300 finais são percorridos em ladeira, cuja inclinação é de 8°). O mesmo em Epsom.
Sem embargo, em termos de adaptação à milha, Rock of Gibraltar se equipara a cavalos imortais, especialistas dessa dificílima distância, como Tudor Minstrel, Brigadier Gerard, a sensacional Miesque, Nureyev, etc. etc.
Mas o que interessa saber para efeito deste tópico, é com quem, teoricamente, suas origens se misturam melhor.
De saída, com as descendentes de Mr Prospector, sendo a afinidade Northern Dancer–Mr.Prospector bastante conhecida no turfe moderno (vide Sea the Stars, Galileo, Giant’s Causeway, etc. etc.). Este é também o caso de Varenar, criado pelo Aga Khan a partir das decisões do grupo que projeta os cruzamentos da coudelaria. Mr Propector não é outro, senão o avô-materno de Varenar.
Dos outros três vencedores de Grupo I gerados pelo reprodutor da Coolmore, Diamondrella tem como avô-materno o americano Dixieland Band, um bom Northern Dancer, pai, na Europa, de Egyptband, ganhadora do Prix de Diane (Grupo I, Chantilly). No caso, estamos diante de um novo reforço – beirando a saturação – de Northern Dancer.
Mount Nelson, por sua vez, é filho de uma filha de Selkirk (Sharpen Up e Annie Edge, por Nebbiolo). O igualmente milheiro Selkirk, eleito “Champion 3-years-old miler da Europa”, em 1991, alazão claro, forte como um touro, 1,69 m de altura, é raça de Native Dancer. De novo, juntar Northern Dancer e Native Dancer, ou ao contrário, não deve causar espécie a ninguém. Os dois se combinam extremamente bem.
Finalmente, a mãe de Eagle Mountain é filha de Darshaan. Mais uma obviedade em matéria de mistura de sangues. O cruzamento de descendentes de Northern Dancer (principalmente via Sadler’s Wells) com mães por Darshaan – uma das jóias raras da criação Aga Khan, pai de Dalakhani, entre outros – é algo consagrado nos anais do turfe europeu, com dezenas de vencedores de Grupo I produzidos pela fórmula. Também aqui, nada de especial.
Ao analisar as origens dos demais ganhadores de Grupo II, III, e “listed races” de Rock of Gibraltar – e a lista é extensa... – verifica-se praticamente uma repetição das alternativas acima mencionadas. O turfe moderno, cada vez mais competitivo, tende a descartar qualquer tipo de improvisação em matéria de raças e cruzamentos; copia-se o que deu certo. Não há nada de errado nisso.
Mas nele, nada ocorre por acaso. Em outras palavras, os supostos “acasos”, quando examinados a fundo, refletem apenas um implacável e rigoroso método, e atendem às necessidades de – exatamente ao contrário do que se imagina – tentar prevenir sua hipótese.
A respeito de Rock of Gibraltar, o Stud Book Brasileiro apresenta uma vasta e variada gama de matrizes que atendem às premissas acima expostas. Selecioná-las criteriosamente, é apenas uma questão de bom senso.
Mais uma rocha entre nós
Tem sido digno de nota o esforço dos criadores brasileiros para trazer ao país, em regime de “shuttle”, reprodutores da qualidade de Royal Academy, Trempolino, Sinndar, Linngari, Elusive Quality, Gilded Time, Macho Uno, Shirocco, Refuse to Bend, e, agora, Rock of Gibraltar. Isso tudo, sem mencionar reprodutores já provados, como Crimson Tide, por exemplo, que aqui se encontram em caráter permanente.
No fundo, são sobre esses pilares que iremos construir o futuro do moderno cavalo de corrida nacional, cujo destino – diante da indigência da estrutura do turfe entre nós, e do aparente desgoverno dos clubes promotores de corridas – tende a ser, preferencialmente, o da exportação. Que seja assim.
Não se pode, por outro lado, deixar de mencionar o conceito que tem orientado a vinda da maioria desses sementais, ainda que temporariamente, para o Brasil, qual seja o de preservar a tradição centenária que nos liga ao turfe europeu. E tem como virtuosa conseqüência, a produção de animais sãos, aptos, não só a abordar distâncias maiores, como se adaptar de forma mais fácil aos testes de peso por idade a partir dos 4 anos. Pois parece ser aí – e não na disputa pelos mercados da velocidade pura – que residem nossas maiores oportunidades de inserção na indústria internacional do PSI.
Diante do crescimento do PIB brasileiro (cerca de US$ 1,730 bilhões em 2009), tudo leva a crer que, mantida a tendência, os próximos tempos da criação entre nós se parecerão em muito com os anos dourados do pós-guerra, quando conseguimos trazer para o Brasil o que havia de melhor no continente europeu em matéria de raças e origens.
É esperar, confiar, e ver.
No “Timeform – Racehorses of 2002” (pág. 823), a Bíblia inglesa das corridas de cavalo, há uma interessante comparação entre os dois animais, resumida da seguinte forma:
“Rock of Gibraltar, cotação de 133 libras-peso (cerca de 66,5 quilos) no “Free Handicap” de 2002, não pode ser elevado ao mesmo nível de Mill Reef (cotação de 141 libras-peso, cerca de atordoantes 70,5 quilos...), pelo simples fato deste último ter vencido suas principais provas por uma margem, medida em corpos, notadamente mais ampla (seis corpos no King George; três no Arc du Triomphe, onde, inclusive, bateu o recorde da distância; dez corpos no Prix Ganay; quatro no Eclipse Stakes, sobre o tordilho Caro; oito no Coventry Stakes; e novamente dez no Gimcrack Stakes) – o único cavalo de corrida a vencer assim, desde que o sistema oficial de graduação de provas de Grupo foi introduzido em 1971.”
O fato, porém, do “Timeform” ter chegado a discorrer sobre a citada comparação, só fala a favor dos méritos de Rock of Gibraltar como corredor. Então, parece razoável aprofundar alguns comentários e observações sobre o animal, que, segundo se informa, virá fazer a monta no Brasil na estação 2010, em regime de “shuttle.” Como se segue.
Quem é Rock of Gibraltar
Nascido em 1999 na Irlanda, medindo 1,62 m, o castanho Rock of Gibraltar é filho de Danehill (este, por Danzig e Raziana, por His Majesty) e Offshore Boom (esta, por Be My Guest e Push a Bottom, por Bold Lad e River Lady, por Prince John).
Nas pistas, foi apresentado 13 vezes, para vencer 10 corridas, e tirar 2 segundos, entre os anos de 2001 e 2002, na Inglaterra, Irlanda, França, e EUA.
Seu pedigree apresenta algumas particularidades, quais sejam: (i) ele é “inbred” 3 x 3 sobre Northern Dancer (via Danzig e Be My Guest), e 4 x 4 x 4 sobre Natalma (a notável filha de Native Dancer, mãe de Northern Dancer); (ii) sua terceira mãe, River Lady, produziu sete ganhadores, entre eles a Riverman, líder das estatísticas de reprodutores na França.
Rock of Gibraltar correu aos 2 e 3 anos de idade, abordando distâncias entre os 1.000 e os 1.600 metros. A seqüência de suas apresentações é a seguinte:
(1) Estreou em 21 de abril de 2001 no Curragh, Irlanda, 1.000 metros, grama, e ganhou seu “maiden”, em cânter; em 19 de junho, foi a Ascot e entrou descolocado no Coventry Stakes (Grupo III), 1.200 metros; retornou ao Curragh, em 1° de julho, e levantou o Railway Stakes (Grupo III), 1.200 metros; em 22 de agosto, venceu, em York, o Gimcrack Stakes (Grupo II), 1.200 metros; em 14 de setembro, correu e ganhou o Champagne Stakes (Grupo II), 1.400 metros, em Doncaster.
No dia 7 de outubro de seus 2 anos, atravessou o Canal, foi a Longchamp, e registrou a primeira vitória de Grupo I de seu cartel, nos 1.400 metros do Grand Criterium. Treze dias depois, voltou a Newmarket, e anotou a segunda: o Dewhurst Stakes, também em 1.400 metros.
Em suma, aos 2 anos, apresentou-se sete vezes, de abril a outubro, entre 1.000 e 1.400 metros, em três países, uma campanha considerada relativamente árdua para um juvenil europeu.
Ao final de 2001, tinha levantado £ 372,581 em prêmios, e foi classificado como o segundo melhor potro de 2 anos da Inglaterra no Handicap Livre daquele ano (o primeiro foi Johannesburg, invicto em sete saídas às pistas, e considerado, à época, a “o fenômeno juvenil” da cocheira de Aidan O’Brien).
(2) Após um merecido descanso de seis meses, Rock of Gibraltar voltou a competir no dia 4 de maio de seus 3 anos, vencendo o tradicional 2000 Guineas (Grupo I), 1.600 metros, Newmarket, primeira prova da tríplice-coroa inglesa de produtos, e terceiro Grupo I da seqüência antes mencionada.
O quarto Grupo I, veio no dia 25 de maio de 2002, quando brincou com os adversários no Irish 2000 Guineas, 1.600 metros, no Curragh. O quinto, em 18 de junho, no Saint James Palace Stakes, 1.600 metros, Ascot. O sexto, a 31 de julho, no Sussex Stakes, 1.600 metros, Goodwood. O sétimo, novamente na França, no Prix du Moulin de Longchamp, dia 8 de setembro, também na milha.
Sua campanha foi encerrada no dia 26 de outubro de 2002, em Arlington Park, EUA, do outro lado do Atlântico, quando, franco favorito, deixouse bater por meio corpo por Domedriver (um bom filho de Indian Ridge, radicado na França, hoje reprodutor) quando da disputa da Breeders’ Cup Mile.
Sobre esta última corrida, a melhor opinião é do conhecido comentarista americano, Andy Beyer, que depois da prova, afirmou: “Se tivesse sido montado por qualquer jóquei americano – de nível médio que fosse – teria ganho.” E se referindo à crônica européia, completou: “Quando é que vão aprender, que as pistas americanas não possuem aquelas longas retas a que vocês estão acostumados?...”
Tudo isso, vem a propósito da forma de correr de Rock of Gibraltar, e da exagerada confiança nas virtudes do potro, demonstrada por Mike Kinane, seu jóquei, quando da disputa da Breeders’ Cup Mile de 2002. Tendo largado mal, Kinane manteve Rock of Gibraltar no fundo do pelotão (penúltimo, num lote de 14 cavalos) durante toda a reta oposta. E lá permaneceu até a entrada da reta final, mais curta que o normal, quando ainda teve de desviar-se do acidente fatal que vitimou Landseer, seu companheiro de cocheira. Embora tenha descontado toda a enorme vantagem dada aos outros competidores, o disco já havia chegado quando ele ainda estava a meio corpo de Domedriver (diga-se, a bem da verdade, impecavelmente corrido por Thierry Jarnet na ocasião).
Mas foi assim, que Rock of Gibraltar sempre atuou: um fantástico milheiro que costumava vir de trás, e usava sua devastadora troca de marcha para decidir seus confrontos a partir dos 400 metros finais. Foi isso que seu jóquei tentou fazer no percurso estreito de Arlington. Portanto, nada a reclamar.
Dele, na ocasião, há duas opiniões, que convém mencionar: primeiro a de Wayne Lukas, o treinador americano recordista de vitórias na Breeders’ Cup: “Rock of Gibraltar é um monstro.” A segunda, do próprio “Timeform” (pág. 829, “Racehorses of 2002”): “Trata-se de um cavalo sério, de trato muito fácil, com suficiente velocidade para ser corrido em qualquer posição do lote em que o jóquei o resolver colocar.”
Eprossegue (pág. 830): “De modelo compacto, tamanho médio (1,62 m), com uma sólida constituição física, ainda que não seja do tipo que atraia, imediatamente, o olhar do observador. Contudo, é obstinado, genuíno e consistente.”
Rock of Gibraltar foi eleito pela crônica o “Champion 3-years-old da Europa em 2002” e levantou, no total, £ 1,269,970 em prêmios.
Rock of Gibraltar na reprodução
Levado para a reprodução em 2003, e estacionado no Coolmore Stud, Irlanda (inicialmente a 90.000 euros a cobertura...), seus primeiros produtos estrearam em 2006. Entre 2003 e 2009, serviu em regime de “shuttle” na Austrália, e durante o ano de 2007, no Japão.
De 2003, até dezembro de 2009, o cavalo de Susan Magnier e Sir Alex Ferguson (“general manager” do Manchester United), que comprou uma parte do animal após a derrota no Coventry Stakes, já produziu 201 ganhadores de 409 corridas e £9,726,905 em prêmios, na Inglaterra e no exterior. Na Inglaterra, a distância média das provas vencidas por seus filhos é de 1.740 metros.
Entre eles, destacam-se os cinco ganhadores de provas de Grupo I (até dezembro de 2009), a saber:
. o alazão dourado Varenar (em mãe por Mr Prospector), da criação Aga Khan, nascido em 2006, brilhante vencedor do Prix de La Forêt (Grupo I), Longchamp, em 2009, batendo a campeã Goldikova (como seu pai, Varenar correu os 1.400 metros do La Forêt vindo de trás, e acelerando nos 300 metros finais);
. a inglesa Diamondrella (em mãe por Dixieland Band), ganhadora do First Lady Stakes (Grupo I), em Keeneland, e do Just a Game Handicap (Grupo I), em Belmont;
. Mount Nelson (em mãe por Selkirk), Eclipse Stakes (Grupo I), e Criterium International (Grupo I), Saint-Cloud;
. Eagle Mountain (em mãe por Darshaan), ganhador da Hong Kong Cup (Grupo I), segundo no Derby Stakes, Epsom (Grupo I), e na Breders’ Cup Turf (Grupo I); e
. o australiano Rock Kingdom (em mãe por St.Covet), vencedor do Epsom Handicap (Grupo I), em Randwick.
Além de vários outros ganhadores de Grupo na Inglaterra, França, Austrália, e Japão.
Misturas que funcionam
Não é preciso ser um “expert” em pedigrees e origens para perceber que Rock of Gibraltar foi todo construído sobre Northern Dancer (aliás, uma velha paixão da Coolmore).
Mais ainda, seu perfil funcional, ou seja, a forma como ele se expressa em corrida, atende integralmente a esse pressuposto. De brilhante “sprinter” aos 2 anos, transformou-se, aos 3, num milheiro de padrão acima de qualquer avaliação. Dos melhores do turfe mundial nas últimas décadas. E com a característica de usar sua velocidade natural para permitir ser colocado onde seu jóquei o desejasse durante o percurso.
Aqui, um pequeno comentário: correr as grandes milhas de Grupo I da Europa, significa correr duas vezes 800 metros num ritmo de “trem do inferno”, como o classificam os franceses. Duas condições são necessárias para que isso ocorra: a capacidade de galopar a primeira metade do percurso sem entrar em apnéia, e ainda ser capaz de produzir trocas de marcha decisivas a partir do último quarto da disputa. Ou é assim, ou não há chance de vitória.
Sem deixar de mencionar que as pistas nem sempre são planas como as nossas (em Longchamp, por exemplo, os 300 finais são percorridos em ladeira, cuja inclinação é de 8°). O mesmo em Epsom.
Sem embargo, em termos de adaptação à milha, Rock of Gibraltar se equipara a cavalos imortais, especialistas dessa dificílima distância, como Tudor Minstrel, Brigadier Gerard, a sensacional Miesque, Nureyev, etc. etc.
Mas o que interessa saber para efeito deste tópico, é com quem, teoricamente, suas origens se misturam melhor.
De saída, com as descendentes de Mr Prospector, sendo a afinidade Northern Dancer–Mr.Prospector bastante conhecida no turfe moderno (vide Sea the Stars, Galileo, Giant’s Causeway, etc. etc.). Este é também o caso de Varenar, criado pelo Aga Khan a partir das decisões do grupo que projeta os cruzamentos da coudelaria. Mr Propector não é outro, senão o avô-materno de Varenar.
Dos outros três vencedores de Grupo I gerados pelo reprodutor da Coolmore, Diamondrella tem como avô-materno o americano Dixieland Band, um bom Northern Dancer, pai, na Europa, de Egyptband, ganhadora do Prix de Diane (Grupo I, Chantilly). No caso, estamos diante de um novo reforço – beirando a saturação – de Northern Dancer.
Mount Nelson, por sua vez, é filho de uma filha de Selkirk (Sharpen Up e Annie Edge, por Nebbiolo). O igualmente milheiro Selkirk, eleito “Champion 3-years-old miler da Europa”, em 1991, alazão claro, forte como um touro, 1,69 m de altura, é raça de Native Dancer. De novo, juntar Northern Dancer e Native Dancer, ou ao contrário, não deve causar espécie a ninguém. Os dois se combinam extremamente bem.
Finalmente, a mãe de Eagle Mountain é filha de Darshaan. Mais uma obviedade em matéria de mistura de sangues. O cruzamento de descendentes de Northern Dancer (principalmente via Sadler’s Wells) com mães por Darshaan – uma das jóias raras da criação Aga Khan, pai de Dalakhani, entre outros – é algo consagrado nos anais do turfe europeu, com dezenas de vencedores de Grupo I produzidos pela fórmula. Também aqui, nada de especial.
Ao analisar as origens dos demais ganhadores de Grupo II, III, e “listed races” de Rock of Gibraltar – e a lista é extensa... – verifica-se praticamente uma repetição das alternativas acima mencionadas. O turfe moderno, cada vez mais competitivo, tende a descartar qualquer tipo de improvisação em matéria de raças e cruzamentos; copia-se o que deu certo. Não há nada de errado nisso.
Mas nele, nada ocorre por acaso. Em outras palavras, os supostos “acasos”, quando examinados a fundo, refletem apenas um implacável e rigoroso método, e atendem às necessidades de – exatamente ao contrário do que se imagina – tentar prevenir sua hipótese.
A respeito de Rock of Gibraltar, o Stud Book Brasileiro apresenta uma vasta e variada gama de matrizes que atendem às premissas acima expostas. Selecioná-las criteriosamente, é apenas uma questão de bom senso.
Mais uma rocha entre nós
Tem sido digno de nota o esforço dos criadores brasileiros para trazer ao país, em regime de “shuttle”, reprodutores da qualidade de Royal Academy, Trempolino, Sinndar, Linngari, Elusive Quality, Gilded Time, Macho Uno, Shirocco, Refuse to Bend, e, agora, Rock of Gibraltar. Isso tudo, sem mencionar reprodutores já provados, como Crimson Tide, por exemplo, que aqui se encontram em caráter permanente.
No fundo, são sobre esses pilares que iremos construir o futuro do moderno cavalo de corrida nacional, cujo destino – diante da indigência da estrutura do turfe entre nós, e do aparente desgoverno dos clubes promotores de corridas – tende a ser, preferencialmente, o da exportação. Que seja assim.
Não se pode, por outro lado, deixar de mencionar o conceito que tem orientado a vinda da maioria desses sementais, ainda que temporariamente, para o Brasil, qual seja o de preservar a tradição centenária que nos liga ao turfe europeu. E tem como virtuosa conseqüência, a produção de animais sãos, aptos, não só a abordar distâncias maiores, como se adaptar de forma mais fácil aos testes de peso por idade a partir dos 4 anos. Pois parece ser aí – e não na disputa pelos mercados da velocidade pura – que residem nossas maiores oportunidades de inserção na indústria internacional do PSI.
Diante do crescimento do PIB brasileiro (cerca de US$ 1,730 bilhões em 2009), tudo leva a crer que, mantida a tendência, os próximos tempos da criação entre nós se parecerão em muito com os anos dourados do pós-guerra, quando conseguimos trazer para o Brasil o que havia de melhor no continente europeu em matéria de raças e origens.
É esperar, confiar, e ver.
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